Mudanças Nem Sempre São Bem Vistas (ou Ouvidas)



O ser humano sempre quer inovar, quer mudar, porque ficar na mesmice, não progride, certo?

Mesma coisa seria no âmbito artístico - muitos querem mudar o estilo, dar uma guinada de 180 graus, virar a mesa, de cabeça pra baixo, para ver se melhora (ou piora, que seja, mas tem que experimentar para saber, senão, vai morrer sem ter feito).

Música, principalmente. 

Mas por que música, dona Kiyomi??? Pelo seguinte: primeiro, porque eu acho mais fácil de comentar e, segundo, eu ouço (e tento) acompanhar o que teria de novo (ou não) no ramo. Nos meus raros dias de folga (tá bom, aos domingos) eu costumo ir à Tower Records de Sakuragicho ou do centro de Yokohama para dar uma ouvida nas novidades (porque as lojas da rede costumam dispor os lançamentos para que os clientes ouçam antes de comprar, e funciona, porque já comprei muito single desta forma...).

O que andei reparando que, se um determinado artista resolve dar uma pequena mudança em seu estilo musical, metade quer matar o artista porque "traiu o movimento" e outra metade quer matar o artista mas no final acaba cedendo e gostando da guinada. Pior que eu conheço mais gente que quer matar o artista por ter "traído o movimento"...

Daí, um dia desses fiquei lembrando de alguns textos que eu fazia para um jornal local, uns quinze anos atrás, que eu resenhava sobre músicos de rock nacional e internacional, com curiosidades, biografias, etc., isso numa época que internet na minha casa era linha discada e ainda por cima restrita, chegando ao ponto de eu e meu irmão mais novo usarmos um cronômetro ao lado do computador para saber o quanto já usamos para não passar do limite e pagar depois por minuto excedente...

Voltando... Nesses textos, eu pesquisava em livros e jornais antigos sobre fatos interessantes dos músicos, o quanto sofreram represálias de fãs ao mudarem de estilo, queda e ascenção e por aí vai. 

Apesar de que, atualmente eu mais acompanho j-pop do que o restante, eu percebi que muito artista que tinha um estilo consolidado e conhecido pelo público chegou a mudar de estilo para angariar mais fãs ou sair da mesmice. Reações e explosões de ânimos foram grandes, mas no final muita gente acaba ouvindo, não tem como escapar (a não ser que more dentro de um buraco a 500 quilômetros de profundidade). Querem exemplos? (Olha, eu sei que tem artista pra caramba, mas são alguns exemplos e eu sei que vai ter gente reclamando, mas que posso fazer?)

- The Beatles: Eu sei que neste Empório não tenho como não falar deles, mas tenho culpa se o quarteto de Liverpool foi um dos pioneiros em mudanças de estilos musicais quando o rock surgiu? Vamos lá: por volta de 1964, quando já conquistaram os Estados Unidos e logo o mundo, resolveram dar uma pequena mudança nas letras de música (porque até então suas letras eram temas de amor inocente), tornando-se mais profundas e confessionais. "I'm a Loser" por exemplo, tinha influência do cantor folk Bob Dylan, mostrando o lado cínico mas cruel do amor. "Help!"foi a confissão de o quanto John Lennon estava inseguro consigo mesmo, chegando a pedir ajuda. Mesmo assim, o quarteto continuava em alta, trazendo inovações em ritmo e letra - culminando com o famoso "Sergeant Pepper's Lonely Hearts Club Band". Não é a toa que os Beatles continuam sendo uma das fontes de inspiração de muita gente por aí.

- The Rolling Stones: "Rivais" dos Beatles no quesito popularidade, musicalmente o quinteto era diferente - enquanto os Beatles se inspiravam no rock and roll, os Stones iam mais fundo, na raíz mesmo, o rhythm and blues, um som mais cru, mais raivoso. Acabaram se rendendo ao rock porque o empresário deles estava cansado do grupo somente interpretar música alheia, sem composição própria. Eis que Mick Jagger e Keith Richards apareceram com "The Last Time", rock mas sem perder a essência do blues. Vamos dizer que, depois que os Beatles encerraram a carreira como grupo, os Rolling Stones seguiram em frente e chegaram a ter músicas de estilos diferentes, como a batida disco em "Miss You", que inspirou o ritmo nas danceterias nos anos 70. Apesar do grupo hoje ser um quarteto, eles continuam em ativa.

- The Monkees: Que muita gente até hoje fale que o quarteto anglo-americano seja uma cópia deslavada dos Beatles, que serviram apenas para uma série de TV, existem méritos que eles possuem e muita gente nem sabia: foram os pioneiros no uso do sintetizador Moog, na música "Daily Nightly". Quando dispensaram o produtor que impedia do grupo tocar seus próprios instrumentos e terem composições próprias, os Monkees também mudaram seu estilo musical - apesar de ter alguma música ou outra do estilo bubblegum, a partir de 1967 já foram letras mais maduras, ritmos entre o folk e o psicodélico e uso de instrumentos musicais como o citado sintetizador, banjo e guitarra de doze cordas. Basta comparar os álbuns "More of the Monkees" e "Headquarters" e sentirão a diferença.

- Bob Dylan: Quando surgiu no cenário artístico, Dylan era considerado o "trovador da folk music", com letras de protesto, confessionais, daquelas feitas para pensar, como "Blowing in the Wind", "Mr Tambourine Man" e "Like a Rolling Stone", por exemplo. Via de regra, cantor de folk music tem que se apresentar tocando violão acústico, sem nada, nadica de instrumentos elétricos, como guitarra. Eis que, em 1965, em uma apresentação em um festival de música folk, Dylan apareceu no palco empunhando uma Fender Stratocaster e o resultado não poderia ser outro - foi severamente vaiado pela platéia, chamando-o de "traídor do movimento". Tentou voltar ao palco com o violão acústico, mas aí o estrago já estava feito...

- Carpenters: A dupla era conhecidíssima por interpretar baladas, quando, em 1972 lançaram o single "Goodbye to Love" e a gravadora a que pertenciam recebeu centenas de cartas de fãs reclamando, acusando-os de "terem se vendido para o hard rock". Motivo: do meio pro final da música, foi inserido solo de guitarra, totalmente distorcido, o que descaracterizava o estilo musical até então. E detalhe: foi o próprio Richard Carpenter (autor da música) quem pediu para o guitarrista Tony Peluso que tocasse o solo distorcido (porque no primeiro take, o guitarrista fez de forma mais suave). Tiveram rádios que se recusaram a tocar a música porque nem sabiam que estilo encaixar (o que resultou do single não ter sido número um nas paradas), mas atualmente, muitos fãs admiram a música por ser completamente diferente das demais.

- The Police: O power trio (formado por Stewart Copeland, Sting e Andy Summers) que nos anos 70 começou como banda new wave, misturando reggae e rock, terminou a carreira com mistura eletrônica. Dá pra perceber devido a pouca discografia do trio - "Outlandos D'Amour" era rock com um pouco de punk. "Reggatta de Blanc", misturaram com reggae e instrumental. "Synchronicity", último álbum, deram a guinada e fizeram uso de instrumentos eletrônicos, embora tivessem boas baladas - mas o que deixou muitos fãs atônitos devido a essa mudança, inclusive na regravação de "Don't Stand So Close to Me", que fizeram remixada e em ritmo mais rápido que a original...

- U2: Quem lembra do grupo irlandes no finzinho dos anos 70, as primeiras músicas que muita gente vai dizer seriam "New Year's Day", "Sunday Bloody Sunday", "October" entre outros, que seriam músicas de protesto. Com o passar dos anos, o grupo foi mudando o estilo musical, mas ainda mantendo a bandeira política (lembrando que o grupo é irlandês e acho que explica quase tudo). Quando surgiram com o álbum "Achtung Baby" em 1991, surpreendeu todo mundo com o visual novo e guinada no estilo musical - mais indie, mais techno, mais alternativo, o que gerou, obviamente, muitas críticas - tanto positivas quanto negativas. Mesmo assim, o quarteto não perdeu a essência política (muito embora muitos critiquem Bono de ser politicamente chato), desde os primórdios de banda desconhecida.

- Paul McCartney: Já que mencionei os Beatles, não custa mencionar pelo menos dois deles que na carreira solo resolveram dar algumas variadas no estilo musical (ok, John Lennon e Ringo Starr também fizeram algumas músicas de estilos diferentes). No caso do Sir Paul McCartney, em sua carreira solo ou junto com Wings, ele andou variando e muito. Nos primeiros álbuns, ainda mantinha mais ou menos o estilo que fazia com os Beatles. Com o Wings, variava entre o rock e as baladas. No álbum solo nos anos 80, "McCartney II", Macca resolveu descontar tudo e boa parte do álbum fez uso de sintetizadores e outros instrumentos eletrônicos. Desnecessário dizer que as críticas foram divididas... Sem falar que nos anos 90 resolveu investir em música clássica e recentemente interpretou standarts de música dos anos 20~30 no álbum "Kisses from the Bottom", que teve boa aceitação da crítica.

- George Harrison: A mudança de seu estilo começou ainda nos Beatles. Em 1965, ao conhecer a cultura hindu devido ao filme "Help!", aprendeu a tocar cítara, na qual utilizou na música "Norwegian Wood". A influência hindu não restringiu somente à música - com o tempo, Harrison passou a seguir o Hare Krishna, tanto que usava o símbolo de Krishna em seus álbuns e em sua assinatura. Claro que ele alternava com rock (vide o álbum "Cloud Nine", que é um de seus melhores até hoje), ironia ("This Song" era uma resposta bem humorada ao processo que perdeu sobre uma alegação de plágio) e baladas, incluindo uma versão mais pop para "True Love", classico de Cole Porter. Sem falar do supergrupo que formou em 1988, The Travelling Wilburys, que fizeram dois álbuns descompromissados, mas que agradou todo mundo! Quando estava começando a voltar a velha boa forma, infelizmente sucumbiu ao câncer em 2001.

- Masaharu Fukuyama: Quando ele surgiu no cenário artístico, começou com rock ("Tsuyoku Ame no Naka" seu primeiro single continua sendo a mais pedida em shows), mas rendeu-se ao pop comercial, como a grande maioria dos artistas (eu disse a grande maioria, não todos, entenderam?), mas sem perder o pique das músicas mais agitadas, alternando com baladas. E as letras, claro, sobre vida, amor, cotidiano. Algumas meio pervertidas ("Peach!!", que tem duplo sentido), outras tentando captar a visão do amor pelo outro lado ("milk tea"). Mas muita gente espantou-se quando fez a música tema para o film animation do Doraemon que entrou em cartaz este ano, com "Ikiteru, Ikiteku", animada e divertida - mas teve gente que achou completamente diferente do estilo que estavam acostumados (do tipo: "Desde quando Masaharu se rendeu a fazer trilha sonora de animes???"). Besteira! A música ficou semanas no top ten da Oricon!


- GLAY: Este quarteto de Hokkaido, surgiu no cenário artístico nos anos 90, como banda de rock (muito embora tivesse visual do estilo visual-kei, com direito a cabelos coloridos e muita maquiagem, mas os grupos GLAY, L'Arc~en~Ciel e Luna Sea DETESTAM ser classificados como visual-kei), mas tiveram lindas baladas como "However", "Beloved" e "Happiness ~ Winter Mix". Resolveram ousar quando fizeram uma collaboration song com o grupo EXILE, em 2005, com a música "SCREAM", com direito a um movie clip - imaginem um quarteto de j-rock com um grupo de R&B juntos: o resultado surpreende. Mas, mais surpreendente ainda foi quando no show que fizeram no Makuhari Messe (Chiba) em julho de 2011 para comemorar os quinze anos de carreira - "HAPPY SWING 15th Anniversary SPECIAL LIVE ~ We ♥ Happy Swing ~ in MAKUHARI" - no meio do show, cantaram "Love So Sweet" (sim, a música tema do dorama "Hana Yori Dango", interpretada pelo grupo Arashi), e o público todo acompanhando!

- Tomoyasu Hotei: Conhecidíssimo guitarrista tanto no Japão como no exterior (chegando a ter uma de suas músicas - "Battle Without Honor or Humanity" - no filme "Kill Bill", além de colaborações com músicos como Hugh Cornwell e David Bowie), Hotei também fez parte do grupo de j-rock BøOWY, nos anos 80, junto com Kyosuke Himuro. Embora tanto no grupo como em carreira solo, seu estilo é puramente rock, é dele a composição de uma das baladas mais bonitas que Miki Imai - sua esposa - interpreta. "Pride" foi tema do j-dorama de 1996, "Doku", e acabou sendo um dos singles mais vendidos em 1996. Recentemente, Hotei e Imai anunciaram que mudar-se-ão para Londres na metade do ano para que o guitarrista tente investir no mercado estrangeiro.

- SMAP: Apesar do grupo possuir músicas de vários estilos (desde temas de anime, passando por hip-hop, pop, baladas), ter colaborações de artistas como Nile Rodgers, Omar Hakim, Will.I.Am (do grupo Black Eyed Peas), Kiyoshiro Imawano, Shikao Suga, Love Psychedelico entre outros, em alguns álbuns essas colaborações acabam sendo nítidas nos estilos de música. Ao vivo, surpreendiam ainda mais - por exemplo, na turnê "LIVE pamS" de 2001, Masahiro Nakai interpretou "However" - um dos maiores sucessos da banda GLAY; em "Drink! Smap! Tour" em 2002, Nakai parodia as Morning Musume na música "The ★ Peace", com uma grande surpresa na segunda parte da música; em "Pop Up! SMAP LIVE!" em 2005, na música "Everybody", Shingo Katori faz dueto com Kumi Koda; em um dos shows da turnê "We Are SMAP! 2010 Concert Tour" em 2010, na música "No Way Out" (solo de Katori), a dupla que compôs a mesma, Love Psychedelico aparece ao vivo no palco. Geralmente o tema das baladas seriam amor e amizade, mas quando lançaram em dezembro de 2011 o single "Boku no Hanbun" (僕の半分), composta por Kazuyoshi Saito, muita gente não acreditava, mas constava ser a primeira vez que era uma balada de amor não correspondido!


- Arashi:  Sempre dizem que a cada single acaba sendo uma surpresa. Músicas dançantes, divertidas, impactantes, baladas e com um toque de rap no meio. Interpretando canções compostas por Fumiya Fujii ("Hitomi no Naka no Galaxy"), Shikao Suga ("Aozora Pedal"), para citar. Nada impediam de usarem batidas eletrônicas, remixes e outros tipos de instrumentações. "Mada Minu Sekai e", do álbum "Beautiful World" foi um exemplo de levada techno. No single mais recente - "Face Down" (tema de encerramento do dorama "Kagi no Kakatta Heya") - houve quem reclamasse de que estariam usando e abusando do auto tone (recurso eletrônico que modifica a tonalidade de voz na gravação) até no sakurap. Acho que tinha comentado no twitter que esse recurso de modificar a voz do artista na gravação, vem desde os anos 60, mais especificamente na música "Tomorrow Never Knows", dos Beatles, em que, além de usarem gravações em fita de trás pra diante (looping tapes), a voz de John Lennon, na segunda parte, foi modificada na gravação a um recurso primitivo chamado "Leslie cabinet speaker". Ou seja: nem foi invenção do k-pop, como alegaram a semana toda quando a música "vazou" no encerramento do primeiro capítulo do dorama.

Eu sei que existem um sem número de casos, mas se citarmos todos, a lista seria imensa e nunca terminaria. Afinal, o mundo vive cheio de mudanças a cada segundo. Neste exato momento, alguém deve estar fazendo algo diferente do normal em algum lugar desta Terra.

Fotos que ilustram este post: via google e tumblr.

Comments

  1. Seu post está excelente e completíssimo! Confesso que pintou uma nostalgia quando citou a internet discada... HAHAHAHA eu adorei essas curiosidades quanto a mudanças no estilo de grandes nomes da música e a reação dos fãs. Eu, quando sinto a mudança em algum ídolo, tento entender não apenas o contexto dessa mudança pro artista como em todo o cenário musical atual. É o que anda acontecendo com o kpop - que é cada vez mais influenciado pelo cenário electro mundial (gaga e similares) e anda ocidentalizando cada vez mais. Bandas que começaram pop (como SHINee) e com R&B estão cada vez mais focadas no electro. Mas não perderam sua essência. É que é muito mais fácil julgar antes de ouvir. Quem é fã de verdade, acompanha o artista no que ele fizer e aceita as mudanças com visão crítica mas com a mente aberta. Eu acredito. E eu AMO carpenters *O*

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  2. Concordo plenamente... ainda mais porque estou na fase de mudanças que são bem e mal vistas rsss

    Kisu!

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