"Power Harassment" ou Abuso de Poder

"Nakanai to Kimeta Hi" ~ J-dorama que retrata o "power harassment" em empresas


Muito se fala (pelo menos aqui) de ijime, mais conhecido como "maus tratos", "bullying" entre outros sinônimos, quando acontece de algum estudante acabar se matando (seja do primário, ginasial ou colegial, ou até universitários) e no fim acaba virando assunto pra semanas ou meses nos principais noticiários.



O que muito vemos (e sentimos) mas quase ninguém comenta - pelo menos eu percebi isso - seria o "power harassment" (no japonês "pawaa-hara"), ou "abuso de poder". E isso acontece diariamente em qualquer empresa que se preze no mundo. Vão me dizer que não!

O power harassment consiste em pressão psicológica e verbal entre veteranos e novatos de qualquer empresa. Sabe aquela história do estagiário que havia comentado no ano passado? Pode ser tragicômico, mas quem já foi estagiário, sabe que esse tipo de funcionário sofre horrores nas mãos de funcionários efetivos (ou não) de empresas, mas milagrosamente consegue escapar de consequências piores.

Experiência própria: eu mesma fui estagiária por um ano em uma empresa financeira. Não me fizeram procurar envelope redondo para carta circular nem carbono pautado, mas os piores serviços sobravam para os estagiários fazerem. Acho que tenho a "leve" impressão que, os carrascos de hoje foram estagiários ontem. E o ciclo continua.

Voltando sobre power harassment.

Imagine você, recém admitido em uma empresa qualquer. Mais perdido que cego em tiroteio, porque, por mais que tenha trabalhado vários anos em algumas empresas, o sistema seria diferente, por mais que tenha feito trabalho semelhante, e é claro, tem que começar do zero. Depois de ter conhecido o terreno onde vai pisar, hora de aprender o serviço. E geralmente te colocam junto com algum veterano para que ele te ensine o serviço. Se levar sorte e seu gênio coincidir com o dele, a empatia será imediata. Mas se for o contrário...

Quando se leva o azar de aprender o serviço com um veterano que não foi com a sua cara mesmo sem abrir a boca, se prepara que o caminho vai ser árduo, a não ser que você consiga contornar a situação e tente provar o quanto você é mais esperto do que se pensa...

Mas nem sempre a coisa funciona como pensamos.

No que pensamos em nos empenharmos para dar o melhor no trabalho, para ganhar o merecido reconhecimento dos demais, por mais que nos esforçamos, sempre vai ter uma (dúzia de) pessoa(s) que vai te criticar, nunca está bom, etc. E se comete um deslize, por menor que seja? Aí, sinto muito, gente, o castigo vem dobrado por mais que peça mil desculpas.

Isso é fato real. Duvido muito quem nunca tenha sofrido "abuso de poder" por menor que seja.

Exclusão de pessoas nos grupos de trabalho (ou de estudo) ~
uma das características do "power harassment"
O power harassment existe, diante de seus olhos e até mesmo você sofre e não percebeu. Ou preferiu aguentar com receio de represálias maiores e custar o seu emprego. Mas existem horas que é preferível perder o emprego do que a vida, em certos casos.

Quando os veteranos começam a "pegar" no seu pé, dizer que tudo o que você faz está errado (por mais que a coisa está certa e foi o próprio veterano quem ensinou), te isolarem de muitos assuntos (ou as chamadas "panelinhas"), pode ter certeza que você sobre abuso de poder, pressão psicológica, e nem percebeu.

Experiência própria 2: pelo menos em três trabalhos que passei, sim, fui vítima de abuso de poder dos veteranos. E o que mais me deixa mais triste é quem os autores eram compatriotas meus. Bem disse uma de minhas primas uma semana antes de embarcar pra cá: "As pessoas nunca vão desejar seu bem no ambiente de trabalho. A maioria quer te ver se ferrar, quer comer seu fígado, fazer sua caveira a qualquer custo". Isso porque ela também foi vítima: em um dos trabalhos que ela fazia, os veteranos sempre faziam alguma coisa para sabotar o trabalho dela e acabar levando uma senhora bronca do chefe depois.

Nunca a frase dela foi tão real quando mudei-me para Kanagawa. Pelo menos nos dois primeiros anos, o trabalho corria bem, a amizade que tinha feito com meia dúzia de almas semiperdidas, porque eu também era uma alma semiperdida naquela empresa. Mas sabe quando você trabalha no seu canto, fica no seu quadrado, faz o seu serviço e ninguém vem te torrar o saco? Essa tranquilidade acabou quando uma veterana começou a pegar no meu pé do nada!!!

Começou a implicar o jeito que eu verificava a peça, escrevia no relatório, até no meu modo de vestir! Eu ficava danada da vida porque, se nem o chefe que é chefe nunca reclamou de nada (até mesmo porque eu nunca dei motivo para isso), vem uma indivídua, que só porque tem mais tempo de casa vem querer mandar em mim - e em mais outras pessoas.

O que com o tempo percebi ~ ela tinha inveja da gente. Inveja porque fazíamos nosso trabalho conforme os chefes mandavam e eles gostavam do nosso serviço. Porque éramos muito ingênuas e tínhamos medo de retrucar aos atos dela. E com o tempo também, pouco a pouco as minhas colegas foram pedindo a conta do trabalho e procurando outro. Eu sei que em qualquer lugar sempre vai existir gente dessa espécime, mas tudo tem seu limite.

O fim da picada foi um dia em que eu estava almoçando e a indivídua implicou até no meu almoço (feito por mim). Não aguentei. Pedi dispensa do trabalho, chorando horrores. Mas não tinha contado para os superiores o que acontecia. Foi quando no final daquela tarde, recebi um telefonema de um emprego onde eu havia feito entrevista algumas semanas antes, me contratando.

Nem precisou esperar duas vezes.

Muitas vezes, quem sofre de "power harassment" acaba fazendo o mesmo para outras pessoas, tramando planos para saber como a vítima reagirá. Ou não.

Na verdade, eu queria tentar alertar aos leitores que o power harassment existe, sim. Em qualquer lugar do mundo. Um tempo atrás, eu vi um cartaz sobre o assunto no corredor da empresa onde trabalho, e achei interessante: ilustrava os possíveis tipos de power harassment, tais como, pessoas que viram monstros, ficam falando de trabalho até no dia de sua folga, vangloriam-se de si mesmos para te rebaixar, formação de "panelinhas", te excluindo de muitos assuntos que poderiam ser do seu interessante. Comunicação unilateral (somente um fala e outro nem te ouve). Entre outros, incluindo até pessoas chegarem ao ponto de te ofender verbalmente.

Mas com que finalidade fazem isso?

Muitas vezes porque os veteranos ficam "incomodados" com os novatos, achando que estes vão acabar tomando seu lugar, o que não é verdade. Por algum motivo não foi com sua cara. E praticam esses atos para ver se o novato desiste de vez, mas o ciclo continua: se um novato sai, outro entra em seu lugar. E o novato sai achando que em outro lugar pode ser melhor. Ou pode acabar sendo pior ainda. Como se pulasse da frigideira pro fogo.

Um dos textos que me chamou a atenção e concordo com o autor, seria a frase final sobre bullying e power harassment, especialmente aqui no Japão: "somente os fortes sobrevivem" (blog "Humus Ideias", post "A seleção natural do ser humano no Japão, onde os mais fortes sobrevivem", por Igaum).

Uma dica também sobre o que acontece em empresas, seria o j-dorama "Naka nai to Kimeta Hi" ("O Dia que Resolvi Não Chorar"), exibido pela Fuji Television de janeiro a março de 2010. A trama se passa em uma empresa de produtos alimentícios, onde uma recém-graduada acaba de entrar, e por um pequeno equívoco no trabalho, passa a ser alvo de bullying dos veteranos e até de chefes, mas ao invés de fugir, resolve enfrentar os maus tratos.

Arriscado? Pode ser, mas se não sermos fortes, sucumbir ao desespero e até dar cabo em sua própria vida será grande.

Fotos: via google e tumblr.


Comments

  1. Bom, aqui no Brasil chamamos o power harassment de Assédio Moral... o pior do Assédio Moral é quando vem dos seus superiores e não só dos seus colegas de trabalho. Particularmente nunca sofri disso, apesar de já ter sofrido de bullying na escola *e ter sobrevivido a isso* não desejo isso pra ninguém.
    Parece que realmente o motivo de tanta humilhação é fazer com que o humilhado peça as contas. Aqui no Brasil isso rende até processo judicial trabalhista, não sei como é aí.

    ReplyDelete
    Replies
    1. Tathy, aqui infelizmente quem sofre de assédio moral, tem que aguentar calado. Existem casos mais extremos em que o humilhado comete suicídio e fica por isso mesmo, apesar que houveram casos de morte devido ao "karoshi" (trabalhar até morrer) e a família processou a empresa. E ganharam.
      Eu também sofri bullying nos tempos de escola e ter sobrevivido a isso já podemos dizer que seria uma vitória.
      Mas trabalhar aqui, ou você acaba entrando no sistema ou acaba dando cabo em sua vida...

      Delete
  2. "Power Harassment" ou Abuso de Poder!

    Uma realidade presente onde existem humanos ...

    Um processo complexo que uma vez desencadeado, provoca danos irreparáveis em certas pessoas fragilizadas ...
    Você disse tudo Kyiomi!

    O que fazer?
    Reagir: uns e outros!
    A vitima e os que estão á sua volta se se apercebem do que lhe está a acontecer!

    Nada há de pior que o SILENCIO!
    O silêncio, permite ao agressor, de continuar tranquilamente, enquanto que a vitima se culpabiliza, perde confiança nela mesma e tenta tornar-se transparente ...

    Sabe uma coisa?
    O agressor, tem um verdadeiro problema de saúde mental!
    Ele é doente mesmo e deve-se tratar!
    Infelizmente, acontece o contrário: é a vitima que é vista como paranóica e precisando cuidados psiquiátricos, podendo assim o agressor continuar a aplicar as suas estratégias diabólicas sem nenhuma moral e respeito!

    Normalmente, a lei do trabalho e civil, deve proteger as vitimas.
    Para isso, tem que se apresentar queixa.

    Mas nada há de melhor que a solidariedade humana desde o principio!
    Recusar dar ouvidos ás más línguas,desencorajando assim o mal intencionado(a)e sobressair as qualidades da pessoa visada!

    Se um humano destrói outro, um humano o pode ajudar!

    Você faz um excelente trabalho no seu blog ♥
    Obrigada pelo conteúdo♥

    Felicidades.
    ✿海子✿

    ReplyDelete

Post a Comment