A Vida Glamourosa de Quem Vive no Exterior

[Pausa para rir, porque dá vontade é de chorar.]


Onde eu moro atualmente. Uma paisagem com algumas casas, postes e muito arrozal.

Dias desses, no Twitter, a Lominha havia postado sobre as pessoas "de fora" acharem que a vida das pessoas que mora "no estrangeiro" (no caso dela, que mora na Coréia do Sul, por exemplo) seria um grande glamour e não podem reclamar de nadica de nada porque tudo é perfeito.

Só quem está do outro lado não sabe o que a gente, que mora "no estrangeiro" passa no dia a dia. Como disse uma outra seguidora "... a vida dá na nossa cara quase todos os dias. E antes de apanhar pra vida, a gente apanha pra gente mesmo.", porque olha, é cada situação que a gente enfrenta morando no exterior, que é só morando no exterior mesmo para sentir na pele e dissipar toda aquela idéia furada que tínhamos - "ah, deve ser uma maravilha morar no exterior..."

Ok, certo que temos certos privilégios de morar no exterior (segurança é um deles), mas no fim é tudo igual - trabalhar, pagar contas, fazer afazeres domésticos, contar a grana para ver se não vai passar aperto até o fim do mês, fazer mercado. Sim, fazemos tudo isso. Quando digo nós, eu quero dizer que não temos pais ou um deles ou empregada doméstica pra fazer toda a tarefa pra gente. E ainda junta o fator costume local e idioma, aí pra entrar em parafuso é um pulo.

O que muita gente não sabe é o quanto muitos de nós, chamados de "privilegiados" (hahahahaha), passamos em cada situação, que só Deus sabe, e tínhamos que ter uma força sobre humana para não jogar tudo pro alto e cair fora. Se ainda estamos batalhando aqui no exterior, é porque temos as compensações no fim do dia.

Cinema: todo mundo critica, mas ninguém vai por pura falta de vontade de aprender o idioma mesmo.

A gente não fica postando no Instagram os perrengues que passamos (pra quê postar coisa ruim, né?). O que muitas vezes a gente quer mostrar no Instagram é que não vivemos no esquema casa-trabalho-casa. A gente mostra que podemos, no exterior, fazer um pão de queijo quase igual ao do Brasil, um bolo de cenoura com cobertura de chocolate, um pão assado na hora. Que mesmo a cidade onde escolhemos (ou escolheram, tanto faz) esconde alguns pontos interessantes. Que a gente tem um momento de diversão, como visitar um museu, fazer piquenique num parque, experimentar a gastronomia local (mesmo que custe alguns momentos no banheiro, depois), e, quem sabe, conseguir ir no show do seu artista favorito.

Uma doceria no meio da multidão de Shinsaibashi (Osaka)

Maaaaaas sempre tem alguém que não tem coração e bota um comentário ridículo no seu post. Na hora a gente fica chateada pra caramba, mas depois a gente faz a egípcia e vai viver a vida. Pior que até mesmo no exterior tem gente assim, mas isso em qualquer lugar do planeta.

Quem me conhece, sabe que estou morando no Japão há 21 anos. Melhor já dizendo que vivo aqui, porque faço quase as mesmas coisas que fazia no Brasil - trabalho, estudo, faço parte dos afazeres de casa (a outra parte namorido é quem faz), pago contas, economizo, reservo um tempo para ir ao cinema, vou a eventos, shows (algo que no Brasil fiz uma vez, comparado com aqui que já perdi a conta)... E mesmo estando há 21 anos morando, ops, vivendo aqui, ainda tem muita coisa a conhecer, e olha que nem era falta de grana, e sim, nunca conseguir organizar o tempo.

Kyoto não é somente Kinkakuji, Kiyomizudera e Fujimi Inari - em Karasuma, centro econômico da cidade, tem o Museu Internacional do Mangá, que foi feito dentro de uma antiga escola.

E olha que, quando morei em Yokohama (bem longe demais do famoso Minato Mirai) trabalhando em Tóquio (em um dos bairros mais velhos da região), consegui conhecer quase toda a província de Kanagawa, quase todos os bairros de Tóquio (inclui aí até Kabukicho, onde passear à noite lá vai por sua conta e risco), parte de Saitama, Ibaraki e Shizuoka. Hoje, morando perto de Nagoya, ao menos tirei um atraso de 20 anos - ter ido para Kyoto, Nara e Osaka (porque o primeiro lugar que morei, era "perto" dessas três províncias, e sequer fui e olha que morei um ano e meio).

Todai-ji, Nara.

Como eu acabei de dizer, sempre vai ter um com mágoa no coração e criticar o fato de você estar passeando muito ao invés de juntar dinheiro. E olha que nem meus pais, que tem hábitos de economizar e aproveitar promoções de 90% de desconto nas compras, vivem me falando isso. É gente próxima a você, que até hoje me pergunto porque veio parar aqui se não gosta daqui. Vontade de falar "o dinheiro é meu, trabalhei pra isso, e eu faço o que eu quiser"...

Daí quando a gente posta algo interessante do lugar onde você foi, muitos vão achar que você vive uma vida de nababo...

A verdade é que, para muita gente, essa glamourização de morar no exterior só vai cair por terra quando sentir o quanto é duro viver aqui. Nem venham com essa de turismo, não. Até mesmo os meus amigos que vieram como bolsistas de universidade, aprenderam o quanto era duro passar o mês com pouco. Que o custo de vida é alto. Mas sabem tirar o lado bom da coisa.

Tirei o atraso no Japão: foram QUATRO vezes que fui no Tokyo Dome pra curtir o show dele.

Até cheguei a cogitar a participar de algum grupo de Brasileiros no Exterior, mas o meu problema seria a diferença do modo de vida profissionalmente falando. Já tentei participar de um grupo no FB de Brasileiros no Japão, mas a maioria dos comentários beira à baixaria e muita troca de "gentilezas". O jeito foi eu manter amizade com alguns gatos-pingados, como pessoas que gostam de j-pop e j-doramas, tradução para o bem-estar da comunidade e fotografia.

Só preciso melhorar o foco, definição, tempo... e uma câmera decente...

E olha que muita gente que tenho amizade até hoje aqui, mora em lugares bem inusitados, mas chegam até a serem muito interessantes. E foi através dessas pessoas que eu acabei descobrindo muita coisa boa e aprendendo a cada dia.

Fotos: todas da autora, tiradas via smartphone Fujitsu modelo F-01K.

Comments